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terça-feira, 31 de agosto de 2010

O primeiro sopro da Literatura Portuguesa






Segundo o escritor Oscar Wilde: “A literatura antecipa sempre a vida. Não a copia, amolda –a aos seus desígnios”, ou seja, lapidando e moldando o espírito. Esta linha de pensamento serve também para os escritores de prova e verso de Portugal que moldaram a cultura falada e escrita entre os anos 1198 – 1507, consolidando a língua vernácula lusa, com uma rica historiografia dos poetas palacianos, nos reinados de Afonso V, D. João II, D. Manuel e finalmente o lírico e teatrólogo Gil Vicente.

Portugal passava por um momento de transição, principalmente no campo político com a formação da Dinastia de Avis e uma nova mentalidade literária, sem perder uma escrita prolixa, entretanto, é um marco na formação da estética e da beleza absoluta, impregnando inclusive os autores trovadores e posteriormente renascentistas. O apetite e a vitalidade dos trovadores luso – galegos ganha força por toda Baixa Idade Média, com uma literatura refinada, tanto na escrita erudita quanto na popular com poesia chamada de “cantares d’amigo” e “cantares d’amor”, enaltecendo a vida campesina e urbana, extremamente popular das meninas casadouras, apaixonadas e com saudades dos seus namorados que foram combater os mouros nas trincheiras. Eis um trecho do poeta, trovador e aristocrata Afonso III:

Vi eu, mia madr’, andar
As barcas eno mar:
E moiro – me d’amor.

Fui eu, madre, veer
As barcas eno ler ( praia )
E moiro – me d’ amor.

As barcas eno mar
e foi – las aguardar:
e moiro- me d’amor.

As barcas eno ler
E foi – las atender ( esperar )
E moiro –me d’amor.

E foi – las aguardar
E non o pu’ achar:
E moiro – me d’amor.

E foi – las atender
E non o pude veer:
E moiro – me d’amor.

E non o achei i,
O que por meu mal vi:
E moiro – me d’amor

( E non o achei lá, o que vi por meu mal:
E moiro – me d’amor. )

Nos séculos XV e XVI ocorre a transição da Literatura trovadoresca com a renascentista, tendo como principais expoentes Gil Vicente, Camões ( foto ) e Fernão Lopes ainda com uma mentalidade feudal nas suas obras, tendo uma grande influência da cultura cristã, fruto da formação da sociedade conservadora e gótica tipicamente medieval.

Fernão Lopes foi um meticuloso historiógrafo, um cronista que valorizava um tom coloquial na escrita lusa, com uma sensibilidade aguçada e novelesca, buscando neste momento um certo distanciamento da retórica e indo em busca da linguagem popular, quase plural nas ideias que estavam em formação, com uma literatura moralista e didática no Reino de Avis, com uma forte presença da poesia palaciana no Governo Joanino.

O teatro português ganha notoriedade com Gil Vicente e Camões, no qual ambos gozam do espírito democrático das letras, porém com rigorosa influência ortodoxa da cristandade portuguesa. Os textos de Gil Vicente estão carregados de lirismo, uma escrita poética e universal, com um sopro de arte histórica para ser exaltada da mesma forma que a Capela Sistina no Vaticano. Sua escrita mostra sensibilidade nas coisas mundanas, bem diferente de Camões ,que tem sim, uma escrita refinada e cosmopolita, no entanto, foge da realidade portuguesa e até européia entre os séculos XV e XVI. Tenho para os leitores uma poesia lírica do português Jorge de Aguiar, seguindo a mesma linha de Gil Vicente e Camões, escrita em 1508:

Coração, já repousavas,
Já não tinhas sojeição,
Já vivias, já folgavas;
pois por que te sojugavas
outra vez, meu coração?

Sofre, pois te não sofreste
na vida que já vivias;
Sofre, pois te tu perdeste;
Sofre, pois não conheceste
como t’outra vez perdias!

Sofre, pois já livre estavas
e quiseste sojeição;
Sofre, pois te não lembravas
das dores de qu’escapavas;
Sofre, sofre coração!

( Cancioneiro Geral, II )

Enfim, estes poetas e escritores trovadores consolidam definitivamente a Literatura Portuguesa com um tom clássico, uma escrita e linha de pensamento que respingou no renascimento com uma dualidade bem definida na escrita ( popular/ erudita ) influenciando outros poetas como Dante Alighieri com a sua magnífica obra homérica “A Divina Comédia” e o escritor renascentista Petrarca.

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