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quarta-feira, 17 de agosto de 2011

A ALFABETIZAÇÃO, INCUNÁBULOS E CULTURA NA ITÁLIA MODERNA.



O professor e historiador da Universidade de Cambridge, Inglaterra, Peter Burke fez uma belíssima pesquisa científica sobre a formação da língua vernácula italiana, apresentando paradigmas na alfabetização dos italianos entre os séculos XIV, XV e XVI [ BURKE, Peter, A Escrita da História, UNESP, São Paulo – SP, págs 354, 1992 ] esmiuçando quatro estilos de alfabetização nos negócios, família, Igreja e Estado que foram fundamentais na formação cultural e intelectual na terra dos Médici e Dante Alighieri. Segundo o historiador, o uso da alfabetização ganhou um forte interesse na segunda metade do século XX, após o grande interesse de novas nações com o processo de alfabetização e o estudo do caso entre antropólogos e sociólogos nos principais centros acadêmicos dos EUA e Europa, enaltecendo a escrita e a língua latina.
O uso da alfabetização nos negócios foi importante para a consolidação da classe burguesa entre os séculos XIV e XV, exigindo o mínimo de conhecimento contábil e das letras mercantis, lettera merchantescha , permitindo desta forma, uma melhor organização do corpo burocrático e na consolidação dos negócios nos anos trezentos e quatrocentos na Itália Moderna. A enorme quantidade de notas, recibos, contratos e livros de contabilidade, assustando até hoje pesquisadores deste período histórico. Segundo o historiador, foram encontrados cerca de 500 livros de contabilidade, com uma riqueza de informações, dando ênfase nos cálculos aritméticos dos florentinos na Baixa Idade Média.
O segundo domínio da alfabetização é o familiar, mais especificamente, o da família patrícia urbana, analisando as cartas familiares, fazendo uma distinção entre três tipos de documento familiar: os documentos como post mordem, ou seja, testamentos, inventários etc. Estes documentos deveriam ser muito bem guardados em cofres para o caso de uma disputa familiar pela herança do falecido. O segundo modelo de carta tem um forte apelo emocional e até passional, com cartas de esposas a seus maridos, dando detalhes domésticos e de grupos sociais que eram vinculados. O terceiro e último uso é o da alfabetização familiar, pode ser definido como “memórias”, com ou sem uma mentalidade saudosista, com uma característica de miscelânea, relatada com característica economicista e poética.
Os membros do clero eram, obviamente, letrados para a celebração de missas e estudo de textos sagrados de caráter teológico, apresentando neste grupo, o maior número de letrados entre os séculos XV e XVI, entretanto, foram encontrados nestes dois séculos, eclesiásticos iletrados que escandalizou membros do Baixo e Alto Clero, porém existiam leigos letrados em Florença, com um nível cultural apurado. Por outro lado, os letrados eram considerados um problema para a Igreja, temendo o avanço da literatura ortodoxa e pagã desde o surgimento da imprensa. O clero temia que os leigos lessem obras “heréticas” numa Europa que sentia os efeitos da literatura protestante, já disponível naquela época. A Inquisição teve um papel fundamental na censura de textos e obras, traduzidas do latim para as línguas vernáculas e condenações, como aconteceu com o moleiro Menocchio, estudado pelo historiador Carlo Ginzburg.
A alfabetização teve uma importância primária na burocratização dos Estados, dando importância no funcionalismo, remonta no mínimo, o tempo da antiga Mesopotâmia com os escribas, que construíram um Estado com leis, implementando uma alfabetização técnica para a sociedade mesopotâmica. No Egito Antigo, segundo o estudo do historiador Ciro Flamarion Cardoso, os egípcios lapidaram o Estado com documentos jurídicos, formalizada pela intelligentsia egípcia. No caso dos italianos, ocorreu uma conexão entre escrita e administração nos estados maiores como Milão, Veneza, Florença, Roma e Nápoles. Estes estados apresentavam relatórios, leis, censos, enfim, dados e registros fundamentais na alfabetização dos estados, permitindo um melhor controle da Igreja sobre o seu rebanho e do Estado sobre os seus súditos. O controle era excessivo inclusive com o sexo feminino. Entre os séculos XIV e XV, alguns homens argumentavam que as meninas não deveriam apresentar qualquer interesse pela escrita e leitura, sugerindo a permanência delas em casa, esperando o seu futuro marido e um total esquecimento da escola.

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