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terça-feira, 30 de agosto de 2011

A MEMÓRIA VEGETAL:DA APOLOGIA À FORMAÇÃO DAS ALMAS








Recentemente, o escritor Umberto Eco publicou vários textos, tendo como principal tema, o livro e as memórias literárias, rica em hermenêutica voltada para os três tipos de memória: social, mineral e vegetal no livro [ECO, Umberto - A memória vegetal e outros escritos sobre bibliofilia, Ed: Record, Rio de Janeiro - RJ, págs 271, 2010 ]. A memória social são heranças de fatos e ideias, transmitidas com um tetê –à – tetê coletivo, herança histórica de gerações ou de um passado recente. Para o escritor, o analfabeto ou iletrado, a memória fica comprometida, sofre de esclerose intelectual por não exercitar a memória. Posteriormente, surge a escrita com a memória mineral, em tábuas de argila com os escribas ou esculpidos sobre pedra; além do uso no nosso tempo atual, com a utilização do silício para o funcionamento de computadores.
Por último, surge a memória vegetal, primeiramente, em pergaminhos. No século XII, passaram à produzir livros com trapos de linhos, algodão e cânhado, facilitando a sua existência e temporalidade por séculos. Hoje, um livro de bolso não tem uma duração de mais de 70 anos. Como um bom bibliófilo, ele cita os trabalhos de Lindisfarne sobre memórias vegetais de uma forma poética e douta da mitologia medieval, com lirismo clássico do latim, rica e presente entre os celtas e irlandeses. A outra obra referencial é de “Lê Três Riches Heures”, do Duque de Berry. Um incunábulo raríssimo que mescla uma literatura que nos proporciona uma visão peculiar do autor sobre as cores do mundo na Idade Média Tardia; uma pincelada literária pré – renascentista.
O resgate da cultura literária heleno – latina foi bem observada pelo autor desta bela obra, com citações homéricas de ilhas, insulares que enriquecem uma literatura romântica com elementos geográficos a partir dos séculos XVI e XVII. Uma literatura surrealista dos bibliógrafos, como o alemão Khunrath, com estudos em hebraico, alemão e latim e citado com deferência por Eco, citando Anau 1609, como uma relíquia e apologia literária por ele e pelos rosacruzistas. Uma obra rica em alquimia, cabala, ciência e mythologia christhiana ou mitologia cristã, com um teor hermético e profano perante a Igreja Católica. Só o frontispício da obra já era o suficiente para colocar a obra no universo herético. Neste universo literário surgem os loucos literários, verdadeiros doidos com temas bizarros como maneiras e posições para dormir em 30 páginas, análises duvidosamente científicas comparando o volume e o odor de fezes entre franceses e alemães. Eco cita os chamados loucos literários profissionais sob o ponto de vista de "especialistas" ou críticos literários. Em 1851, Moby Dick foi recusado na Inglaterra com a seguinte avaliação:" Não achamos que possa funcionar no mercado da literatura para jovens. É longo, de estilo antiquado, e cremos que não merece a reputação de que parece gozar". Flaubert, em 1856, com a célebre Madame Bovary, recebeu a seguinte carta:"Cavalheiro, o senhor sepultou seu romance num cúmulo de detalhes que são bem desenhados, mas totalmente supérfluos". O crítico literário francês Eugéne Poitou dizia o seguinte sobre Honoré de Balzac:"Em seus romances não há nada que revele particulares dotes imaginativos, nem trama, nem os personagens. Balzac jamais ocupará um lugar de destaque na literatura francesa". Um grande equivoco, é claro, com literaturas surreais ou simplistas, Eco enaltece como poucos a memória vegetal e sua importância no passado, presente e principalmente para o futuro. Um livro denso e completo.

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